Violência Doméstica e Contra a Mulher. Desafio da Sociedade – Osmar Ventris

Comparando com as zonas em conflito (guerras) em todo o mundo, o secretário-geral da ONU lembrou que a violência não se limita ao campo de batalha e que “para muitas mulheres e meninas, a ameaça parece maior onde deveriam estar mais seguras: em suas próprias casas”.

Segundo o site Nações Unidas Brasil[1], O chefe da ONU, António Guterres, pediu medidas para combater o “horrível aumento global da violência doméstica” dirigida a mulheres e meninas, em meio à quarentena imposta pelos governos na resposta à pandemia da COVID-19.

Comparando com as zonas em conflito (guerras)em todo o mundo, o secretário-geral da ONU lembrou que a violência não se limita ao campo de batalha e que “para muitas mulheres e meninas, a ameaça parece maior onde deveriam estar mais seguras: em suas próprias casas”.

Segundo declarações da ONU, “Surpreendentemente, a violência de gênero é uma causa tão grave de morte e incapacidade entre as mulheres em idade reprodutiva quanto o câncer, e uma causa maior de problemas de saúde que os acidentes de trânsito e a malária combinados.”

No decorrer da pandemia:

“Desde o início da pandemia, a ONU está relatando que o Líbano e a Malásia, por exemplo, viram o número de chamadas para as linhas de ajuda dobrarem, em comparação com o mesmo mês do ano passado; na China elas triplicaram; e na Austrália, o Google registrou o maior número de buscas pelo termo “violência doméstica” dos últimos cinco anos”.[2]

No Brasil:[3]

o Brasil apresenta causas estruturais e específicas para a violência.

Estas causas são frutos de uma composição de pelo menos três ingredientes, dentre outros:

Ingrediente 1: estar em um país que tende a resolver conflitos de maneira violenta

Ingrediente 2: estar em um país com uma cultura de opressão às mulheres

Ingrediente 3: pouco interesse de priorização da agenda pelas autoridades em geral

Juntando esses ingredientes, já temos um cenário catastrófico: 27% das mulheres com 16 anos ou mais sofreram algum tipo de violência nos últimos 12 meses. Agora, ainda podemos adicionar mais um a essa receita: o isolamento social. 

Quanto a violência doméstica está aumentando?

Alguns estados brasileiros têm divulgado dados alarmantes decorrentes do isolamento social.

No Rio Grande do Norte, no período entre 12 de março a 18 de março, os casos de violência doméstica aumentaram 258%[4](duzentos e cinquenta e oito por cento) com relação ao mesmo período do ano anterior, de acordo com o Observatório da Violência do Rio Grande do Norte.

No Rio de Janeiro, segundo dados do Tribunal de Justiça do estado, desde o início da quarentena no mês de março, as denúncias por violência doméstica e familiar saltaram mais de 50%[5] (cinquenta por cento).

Em São Paulo, epicentro da pandemia no Brasil, o Núcleo de Gênero em parceria com o Centro de Ajuda Operacional Criminal do Ministério Público paulista divulgaram uma nota técnica que mostra que de fevereiro a março de 2020 houve um aumento de quase 30% (trinta por cento) das medidas protetivas de urgência e de 51,4% (cinquenta e um vírgula quatro porcento) de prisões em flagrante comparado ao mesmo período do ano anterior.

Como já dito, as informações são imprecisas. Os registros de boletins de ocorrência e medidas protetivas estão em queda, devido, provavelmente, à subnotificação. No entanto, os atendimentos pela Polícia Militar e os feminicídios estão aumentando.

Para auxiliar no balanço de informações, muitos pesquisadores estão recorrendo a fontes alternativas de dados para terem mais elementos de análise. A pesquisa do Fórum Brasileiro de Segurança Pública[6] coletou dados de publicações no Twitter e, analisando relatos por vizinhos de brigas de casais (com indícios de violência doméstica), registrou um aumento de 431%, entre fevereiro e abril de 2020.

Mas o que fazer diante disso?

A ONU-MULHERES[7] Publicou no dia 7 de agosto, em comemoração aso 14 anos da Lei Maria da Penha, DIRETRIZES PARA ATENDIMENTO EM CASOS DE VIOLÊNCIA DE GÊNERO CONTRA MENINAS E MULHERES EM TEMPOS DA PANDEMIA DA COVID-19, com orientações diversas a serem observadas.

Porém, a conscientização passa, também pelo histórico e pelos fatores estruturantes, culturais e organizacionais que contribuem para a violência doméstica.

PERCEPÇÃO DO HOMEM SOBRE A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER:

Em 2013, o Instituto Avon e o Data Popular realizaram a pesquisa Percepções dos Homens Sobre a Violência Doméstica Contra a Mulher, que conversou tanto com homens autores de violência quanto com homens e mulheres da população em geral

73% ACREDITAM QUE FALAR DE SEUS PROBLEMAS COM OS OUTROS É COISA DE MULHER;

85% ACHAM INACEITÁVEL QUE A MULHER FIQUE BÊBADA;

69% Acham inaceitável que elas saiam sem o marido;

46% Condenam usarem roupas curtas.

41% dos entrevistados conhecem alguém que já usou de violência contra a mulher;

Apenas 16% reconhecem que já foram violentos.

O QUE A SOCIEDADE PODE FAZER?

Em termos de PROTAGONISMO CIDADÃO, o que temos em mãos que pode ser feito sem esperar do governo ou de organizações que precisam vencer burocracias?

Em Setembro de 2014, a ONU lançou o programa “HEFORSHE”[8] (ELEPORELA em tradução livre), que cresceu e está em vigor até hoje, com objetivo de engajar homens e meninos para novas relações de gênero sem atitudes e comportamentos machistas. O programa estimula o protagonismo popular para ações voluntárias e criativas de conscientização visando quebrar o ciclo cultural e estruturante que culminam com atitudes e ações violentas contra as mulheres, seja no âmbito doméstico ou público.

Comprometimento da sociedade e principalmente do grupo familiar, se mostra como ferramenta eficaz, se utilizada antes, ou seja, de forma preventiva

O agressor é o homem. além de programas de proteção e de assistências às mulheres, A Lei Maria da Penha prevê a criação de centros de educação e reabilitação de agressores, exatamente para prevenir reincidência e prevenir a existência de novas vítimas. Grupos de atendimentos se fazem necessários, porém há muito poucos. Daí a importância de movimentos como “HEFORSHE” para estimular a comunidade, organizações empresariais e governos se mobilizarem pois é um grave problema social que necessita de solução e não só de punição, eis que o período de prisão, quando há, apenas agrava a agressividade, pois não há programa de reeducação ou de conscientização.

Capacitações de líderes comunitários e de voluntários para métodos de solução de conflitos, tais como Justiça Restaurativa, Círculos de Construção de Paz, Constelações Sistêmicas, Psicodrama, Rodas de conversa envolvendo homens e mulheres, contribuem para mudança de Cultura e de comportamento, de baixo para cima, o que é mais eficiente do que esperar por programas do governo, sempre carregados de burocracias e as vezes de linguagens que afastam interessados.

Lembrando que as metodologias da Justiça Restaurativa, tem por objetivo a restauração, reintegração, solução de problemas, resgate da autoestima, empoderamento da vítima, responsabilização do ofensor, reparação de danos no que for possível. Comprometimento da sociedade e principalmente do grupo familiar, se mostra como ferramenta eficaz, se utilizada antes, ou seja, de forma preventiva. Não tratar a Violência contra meninas e mulheres somente em cursos e palestras ou através de legislação de eficácia duvidosa em função da cultura ainda reinante, cuja barreira não se rompe com a caneta, mas com ações diárias, e, nesse sentido, programas comunitários, liderados por membros das comunidades, podem contribuir com maior eficiência.

As redes sociais são instrumentos importantes, quando bem utilizadas, tanto para denúncias, como para troca de informações e de conscientizações, inclusive para registro de ocorrências pela Internet, oferecendo mais segurança para a vítima relatar em primeira pessoa a ocorrência.[9]

As Plataformas EAD também se mostram ferramentas excelentes para capacitação de agentes para atuar em seu meio social em ações de conscientizações e de prevenções, bem como de socorro e denúncias.

Para participação efetiva da sociedade, bastaria que o Estado, neste momento de debilidade financeira, apenas definisse diretrizes através de criação de políticas para impulsionar as iniciativas populares e empresariais.  Ocorre que o Poder Público não consegue fomentar, facilitar sem criar leis, decretos, regulamentos e portarias, de tal forma que até a Justiça Restaurativa está virando uma espécie de Código Civil e os Facilitadores transformados em portadores de títulos que lhe garantem reserva de mercado. Ou seja, criar dificuldades para vender facilidades e abrir espaços políticos, dificultando ou impossibilitando o atendimento das demandas sociais.


[1] Nações Unidas Brasil – https://nacoesunidas.org/chefe-da-onu-alerta-para-aumento-da-violencia-domestica-em-meio-a-pandemia-do-coronavirus/

[2] Site acima citado

[3] Site POLITIZE – https://www.politize.com.br/violencia-domestica-no-brasil/

[4] http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/no-rn-viola-ncia-doma-stica-cresce-260-durante-pera-odo-de-isolamento/480596

[5] https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2020/03/23/casos-de-violencia-domestica-no-rj-crescem-50percent-durante-confinamento.ghtml

[6] http://forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/2018/05/violencia-domestica-covid-19-v3.pdf

[7] ONU/MULHERES – http://www.onumulheres.org.br/noticias/onu-mulheres-lanca-documento-com-diretrizes-para-atendimento-em-casos-de-violencia-de-genero-contra-meninas-e-mulheres-em-tempos-da-pandemia-covid-19/

[8] http://www.onumulheres.org.br/noticias/onu-mulheres-faz-lancamento-da-campanha-heforshe-para-mobilizar-pela-igualdade-de-genero/

[9] GENJURÍDICO.com.br – http://genjuridico.com.br/2020/04/17/combate-a-violencia-domestica-covid-19/