PRIVATIZA! TUDO! – ARTIGO – Erik Sanches

No final do século passado eu trabalhei como assessor de Comunicação da Companhia Docas do Estado de São Paulo, a Codesp. Naquele período, a concessão de áreas para operação de empresas privadas estava em plena decolagem, e a paisagem do maior porto da América Latina começava a mudar.

Novos e gigantescos portainers e transteirnes (simplificando, guindastes) eram instalados, áreas cercadas; portarias, escritórios e muitas esteiras e novos armazéns, aos poucos, iam surgindo em substituição a uma estrutura abandonada e subutilizada.

Como de se esperar, resistências, dúvidas e conflitos surgiam de todos os lados, mas, iam sendo vencidas e o processo seguiu em frente.

Hoje, mais de 20 anos depois, podemos, sem sombra de dúvida, afirmar que o resultado do programa de privatização, considerando todos os equívocos e erros cometidos, é majoritariamente positivo.

Com um detalhe que não deixa dúvidas: tudo aquilo que sob qualquer modelo seria atribuição privada, melhorou; enquanto tudo aquilo que continua dependendo de decisões vinculadas ao governo, segue ruim.

 

E isto não é opinião; é fato. Basta pesquisar pelas notícias nos últimos anos para se constatar que enquanto a movimentação de cargas aumentava nos novos terminais que foram sendo construídos, a quantidade de caminhões congestionando vias de cidades e estradas em toda a região também aumentava, sem a correspondente ampliação do modal ferroviário no transporte de e para o porto.

Denúncias de corrupção continuaram, chegando a levar para a cadeia diretores da empresa; a ligação seca (túnel ou ponte) jamais saiu do papel e tudo indica que acontecerá para atender aos interesses de uma concessionária de rodovias e não para resolver problemas do próprio porto. E muitas outras coisas mais.

Isto sem falar em problemas crônicos como terminais de granéis no meio da cidade, linhas férreas internas que precisam percorrer dezenas de quilômetros misturando-se ao tráfego urbano. E uma região inteira, a do Valongo, que segue abandonada em berço esplêndido por absoluta indecisão e incapacidade do poder público de resolver o assunto e colocar toda a área para gerar recursos.

Mas, por que um jornalista, que há exatos 22 anos não trabalha mais no setor de logística e muito menos em algo que ao menos tangencie com as atividades portuárias está palpitando sobre este assunto?

Porque há 22 anos que os problemas estruturais são os mesmos, absolutamente os mesmos, sem tirar nem por. Porque cansa ler as mesmas notícias sobre os mesmos problemas há tano tempo.

Há poucos dias, assisti a um documentário em um canal de TV a cabo, sobre algumas ações que o governo dos Estados Unidos adotou após a Segunda Guerra Mundial e que impulsionaram setores inteiros da economia.

Apenas como exemplo, foram abertas muitas estradas com capacidade para receber pousos de aviões, como forma de garantir a defesa e proteção do país em caso de ataques externos. Isto favoreceu a indústria automobilística, que moldou os costumes de toda a sociedade, criou demanda para o surgimento de postos e restaurantes nestas estradas em periferias de cidades (KFC, McDonalds), melhorou a distribuição de produtos desenvolvidos para abastecer os soldados durante a Guerra (chocolates M&M). E muitas outras coisas mais.

E aqui? O que nossos contínuos governos fizeram para progredirmos desde meados do século passado? Exceto Juscelino, que criou uma base industrial moderna, mas a um custo inflacionário que repercute até hoje, não sei o que responder.

E vejam que estamos falando apenas do porto. Pobre porto, que nasceu privado, responde por cerca de 1/3 de todo o comércio exterior brasileiro apesar de ter um custo operacional elevadíssimo que compromete a competitividade de nossas exportações; que vive à sombra de interesses políticos ou represado por um bairrismo anacrônico, como as propostas de regionalização ou até municipalização.

O Brasil (e não somente o porto) merece tamanho atraso, tamanha falta de visão estratégica, tamanha falta de lógica ou conteúdo deste argumento.

Se metade dos projetos a que tive acesso ainda no final do século passado, quando por lá trabalhei, tivessem saído do papel, toda a região estaria muito, mas muito mais desenvolvida.

Por isso que eu já dizia e reafirmo: PRIVATIZA! TUDO! Inclusive a administração. Ou será, principalmente, ela?