No mês de abril de 2020 uma operação da Polícia Civil do Estado de São Paulo iniciou uma série de prisões com foco em um grupo de pessoas ligadas a área da saúde acusadas de roubarem 50 mil máscaras de hospitais da região. Além dos mandados de prisão também foram cumpridos mandados de busca e apreensão, estendendo os trabalhos dos profissionais da área de segurança pública por alguns dias e chamando a atenção para um fato, infelizmente, não inédito neste país.
“Você já reparou em como as redes sociais andam estereotipando alguns profissionais? Vejo publicações com a mesma prática e em relação as mais diferentes áreas de atuação, sempre seguindo os mesmos padrões de generalização, dos quais discordo absolutamente”
Patrícia Rezende Pennisi
A prática não teve início com a pandemia de COVID-19, mas talvez tenha sido a primeira a chamar a atenção de grande público desde o seu início. Isso já ocorria há pelo menos dois anos, de acordo com as declarações feitas pelo delegado seccional Roberto Monteiro, e não foram somente máscaras que os tais “profissionais” roubaram, no pacote constavam também luvas, curativos, cateteres, outros insumos hospitalares e, até álcool em gel. Isso mesmo, o álcool em gel que deveria ser utilizado dentro dos hospitais para segurança daqueles que bravamente ocupam a linha de frente no combate ao coronavírus e no atendimento às pessoas, mas que estão contraindo o vírus, meros mortais que são, correndo mais riscos do que os que a própria profissão já lhes impõe, com ajuda do mau comportamento de alguns de seus coleguinhas, que viram na situação trágica que estamos vivendo mais uma oportunidade de comercialização e de monetização de produtos fornecidos pelo Estado, desta vez de equipamentos de proteção individual (EPIs), que obrigatoriamente deveriam ser utilizados para sua proteção.

De tudo isso, me pego pensando no que leva pessoas que têm um emprego cujas atribuições envolvem o uso de suas habilidades em prol do bem-estar público, a roubarem, gente! Roubarem materiais essenciais, equipamentos que em qualquer momento seriam imprescindíveis, mas que especialmente neste, tão triste e cinza, significam, no mínimo, um pouco de segurança no exercício da profissão responsável por ao menos tentar salvar tantas e tantas vidas. O que pensam pessoas capazes de tais atitudes?
Por mais que eu me esforce para usar a empatia em quaisquer situações confesso que, especificamente nesta, não deu muito certo e, mais que isso, ainda me trouxe algumas outras reflexões, que quero compartilhar com você leitor.
Você já reparou em como as redes sociais andam estereotipando alguns profissionais? Vejo publicações com a mesma prática e em relação as mais diferentes áreas de atuação, sempre seguindo os mesmos padrões de generalização, dos quais discordo absolutamente, exemplos: policiais são desonestos; profissionais da saúde são heróis; professores são sempre injustiçados; entre tantos outros.

Por trás destes estereótipos há sempre pessoas que não os merecem e isso serve para boas ou más qualidades atribuídas como sendo características comuns a todas as áreas. Há profissionais que se esconderam e escondem por trás de seus jalecos brancos desviando EPIs para obterem vantagens ilícitas e que nunca mereceram ou merecem o título de heróis; há policiais que se esforçam todos os dias para cumprirem determinações legais que gostariam muito de viverem em um mundo mais justo e que, não raras vezes, adoecem diante de tantas atrocidades que presenciam, desenvolvendo doenças mentais que muitas vezes culminam em suicídios; e, há ainda, professores que não estão nem um pouco preocupados com seus alunos, capazes de assediá-los, negociarem notas e outras ‘cositas’ mais!
O simples fato de alguém assumir um cargo não deveria ser critério de análise para sugerir que devamos respeitar mais este ou aquele cidadão, afinal, onde está a igualdade prevista em nosso artigo 5º da Constituição Federal?
Ao adotarmos critérios rasos como os baseados em estereótipos de profissões, somos condutores daquilo que, em muitos momentos, nós mesmos criticamos e alimentamos a velha ideia de que o respeito está no ter e não no ser. Ter um jaleco branco significa ser herói, ter uma farda significa ser corrupto, ter um giz branco significa ser educador. Mentira!

Com base nestas mentiras é que nem percebemos, mas criamos condições favoráveis para que criminosos e maus-caracteres vistam-se de máscaras e apresentem-se como acima de qualquer suspeita pelo simples fato de ocuparem um determinado cargo e (mal) representarem profissões que certamente têm grande importância para a nossa sociedade.
Os profissionais têm q ser vistos individualmente, sem máscaras, por suas ações e porque tiveram comprometimento e respeito com aquilo que se comprometeram a fazer no dia em que assumiram seus postos de trabalho, ou ainda, porque fizeram mau uso da confiança que lhes fora atribuída. Há bons e maus profissionais em todas as áreas e muita gente falando em competências sem ter a mínima noção do seu significado, que está longe de ser representado somente por um título, diga-se de passagem.
Em tempos de uso obrigatório de máscaras é prudente e altamente recomendável que seu uso seja feito corretamente, cobrindo e protegendo apenas o nariz e a boca, jamais as atitudes!