Uma de minhas paixões é a música! Por isso tenho sido compelido à nostalgia.
Paradoxalmente, há pessoas que sentem saudade, ou medo, do que ainda não viram ou sofreram, parafraseando o Legião Urbana.
Belchior, nos anos de 1970, ecoado por Elis Regina, dizia que tudo o que era novo, antes, já era antigo; e que seus ídolos ainda eram os mesmos, embora as aparências não enganassem mais. Ainda hoje, e desde sempre, tem gente que prefere ou é condicionada a crer em aparências.
Os autores têm intenções quando compõem, mas às vezes são “traídos” por elas, como em: “Dormia a nossa Pátria, mãe tão distraída, sem perceber que era subtraída em tenebrosas transações”, de Chico Buarque. Nela, ele também afirmava, ambiguamente: “Vai passar”. Parece que essa frase vem sendo repetida desde 1500!
Ainda nos anos de 1970, Paulo César Pinheiro e Sueli Costa exprimiram, em “Cordilheiras”, via Simone, com triste ironia: “Eu quero ser da legião dos grandes mitos, transformando a juventude num exército de aflitos”.
Músicas como essa, a de Belchior e tantas outras, fazem pensar. Não têm palavras de ordem, nem embalaram protestos. No entanto, fazem refletir e evolucionar, em vez de convulsionar, revolucionar ou contrarrevolucionar. E evoluções são progressivas, ao contrário das revoluções, que normalmente são feitas pela imposição de força e, via de regra, assim são mantidas. As revoluções têm muito a ver com doutrinação, fanatismo, desespero, ou seja, com ausência de liberdade de pensamento. E quando tingidas de sangue, suas feridas não cicatrizam, potencializam revezes.
Naqueles anos de 1970, quem fazia parte da “legião dos grandes mitos”, que transformava a juventude num exército de aflitos? Esses ídolos ainda são os mesmos?
A julgar pela atualidade, por presença ou herança, sim! E mesmo que novos surjam, o ranço permanece sendo ensinado e condicionado pelos medos, traumas e opções de quem idolatra cadáveres insepultos, muitos deles autores de suas próprias lendas. E esses mitos e seus discípulos usam maliciosamente sua ascendência sobre os jovens.
Naqueles anos de 1970, quem fazia parte da “legião dos grandes mitos”, que transformava a juventude num exército de aflitos? Esses ídolos ainda são os mesmos?
Clamam que é proibido proibir, como cantava Caetano, para, depois, proibir até com mais rigor. Combatem preconceitos e ódios com as mesmas “armas”. Vencedores, de vítimas tornam-se algozes, o errado vira certo ou ideologicamente justificado. Assim, o cipó de aroeira, de Vandré, só muda de mãos.
Belchior afirmava que precisávamos, todos, rejuvenescer. Mas como ser jovem ou rejuvenescer em tempos de alienação induzida, ansiedade e incerteza?
Quem mal começou a viver já tem saudades e medos do que não viu, comprovando que medo e o ódio são sentimentos tão poderosos e contagiantes quanto a pior das pandemias, pois têm muitas formas de disseminação, oficiais e dissimuladas. Adquiridos desde cedo, tendem a gerar sequelas por toda a vida, podando momentos e desviando destinos, como na música de Mílton Nascimento e Wagner Tiso.
Belchior afirmava que precisávamos, todos, rejuvenescer. Mas como ser jovem ou rejuvenescer em tempos de alienação induzida, ansiedade e incerteza?
A esperança é que os mil demônios e fantasmas que sempre disputam a alma dos jovens sejam superados pelo livre pensar, sem grilhões de qualquer espécie, sem aceitar ser mais um num rebanho destinado à tosa, abate ou sacrifício por seus ícones.
Enfim, para que o broto nos dê flor e fruto, e não espinhos e amargura.