DESESTATIZAR: TO DO OR NOT TO DO? Adilson Gonçalves – ARTIGO

 

“A relação porto-cidade deve ser aprimorada, com a participação dos municípios e entidades ligadas a operações portuárias e retroportuárias em conselho a ser criado, ou redefinindo as funções do Conselho de Autoridade Portuária”

Adilson Gonçalves

 

O Governo Federal tem adotado uma postura bastante agressiva no âmbito da melhoria da infraestrutura e logística. Obras paradas há décadas, como rodovias e de saneamento, estão sendo retomadas e concluídas, utilizando as Forças Armadas e a iniciativa privada.

Outras iniciativas, como a BR do Mar, o novo Marco do Saneamento e as renovações de concessões de ferrovias, também contribuirão para melhorar a infraestrutura do país, indispensável ao desenvolvimento sustentável, considerando aspectos ambientais, sociais e econômicos.

Estatais, antes deficitárias, infladas por cargos nomeados politicamente, muitos sem qualquer qualificação, agora apresentam lucro! Caso da Autoridade Portuária de Santos.

Então, porquê falar em desestatizar? Bem, “enxugar a máquina”, gestão técnica, sem ingerência política, e racionalização de custos são importantes, seja numa empresa pública, seja na iniciativa privada. A diferença está na autonomia decisória e nas restrições legais.

“O Porto de Santos é o maior porto da América Latina, quiçá do Hemisfério Sul. Tem quebrado seguidos recordes de movimentação de carga, apesar de todas essas restrições, mas pode mais, muito mais, se tiver autonomia”

Adilson Gonçalves

 

No atual modelo do sistema portuário nacional, as decisões são centralizadas em Brasília, o que tende a prejudicar a realização de potenciais de portos públicos. As restrições impostas pela Lei Federal nº 8.666/1993, apesar de algumas flexibilizações posteriores, via de regra geram judicializações que já prejudicaram a dragagem do Canal do Estuário, prejudicando as operações de vários berços de atracação.

O Porto de Santos é o maior porto da América Latina, quiçá do Hemisfério Sul. Tem quebrado seguidos recordes de movimentação de carga, apesar de todas essas restrições, mas pode mais, muito mais, se tiver autonomia.

O Governo Federal alega que não tem recursos financeiros para investir o necessário no sistema portuário nacional. Daí, veio a proposta de desestatizar não os portos, mas as autoridades portuárias, de forma a dar-lhes autonomia e potencializar recursos da iniciativa privada.

 

O Porto de Santos é um enorme ativo, mas também o mais complexo. Daí, o Governo Federal iniciou um processo de desestatização coordenado pelo BNDES, que já tem definida uma consultoria externa. O processo inclui estudos, consultas, audiências e, segundo o Minfra, deve ser levado à licitação no segundo semestre de 2022, se não houver intercorrências.

As vantagens da desestatização incluem maior autonomia de gestão, agilização de contratações, potencialização de dragagem de aprofundamento para 17 m, permitindo o acesso de grandes embarcações de longo curso; redução de tarifas portuárias (oremos) e, segundo o Governo Federal, a inclusão da ligação seca entre as margens do Canal do Estuário, via túnel. Tudo isso favorece à competitividade dos produtos movimentados no porto, incremento da arrecadação de impostos, em todos os níveis e, no caso de expansão territorial, nova economia, novas receitas e geração de empregos.

Então, o que temer da desestatização do Porto de Santos, e deve ser considerado no escopo do processo de desestatização?

 

Bem, alguns importantes itens devem ser considerados, tais como: toda a iniciativa deve ser pautada em sustentabilidade plena; o Governo Federal deve manter controle sobre o ativo, de maneira a evitar ações depreciativas do futuro gestor, que favoreçam portos concorrentes, públicos ou  privados, ou interesses hegemônicos externos; a relação porto-cidade deve ser aprimorada, com a participação dos municípios e entidades ligadas a operações portuárias e retroportuárias em conselho a ser criado, ou redefinindo as funções do Conselho de Autoridade Portuária, de modo que interesses governamentais e privados sejam sempre contemplados.

Tudo isso deve ser acompanhado de perto, no processo em andamento.

Lembremos que durante 90 anos, uma empresa privada, a Companhia Docas de Santos (CDS) geriu o Porto de Santos, contribuindo de múltiplas maneiras com a Cidade de Santos, incluindo a construção de escola e apoio financeiro às novas instalações da Santa Casa de Misericórdia de Santos, entre outras.

Toda iniciativa sempre terá seus prós e contras. O importante é que o modelo de desestatização considere a otimização dos prós e a mitigação, quiçá, supressão dos contras.