Perigos que nos cercam. O que a sociedade precisa saber?

“Seria importante fazer uma divulgação maior (dos planos de gerenciamento de risco), para que a população pudesse ter mais consciência de onde ela habita e trabalha, envolvendo todo um sistema de prevenção, para melhorar o controle de risco”.

Osmar Piasentin

RISCO POTENCIAL PARA GERAR IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS NEGATIVOS

As substâncias químicas, nocivas e perigosas, movimentadas na região pelo Porto de Santos e pelo Polo Petroquímico de Cubatão são riscos permanentes a população local, com potencial para gerar impactos socioambientais negativos, constantemente debatida por especialistas, órgãos reguladores e ambientalistas da região.

Em 2015, um incêndio de grandes proporções atingiu tanques de combustível da empresa Ultra cargo em Santos. O incêndio teve início no dia 2 de abril, por volta das 10 horas, e foi extinguido completamente apenas em 10 de abril, totalizando nove dias de incêndio. O incêndio trouxe várias consequências para os moradores das redondezas como complicações respiratórias e chuva ácida. Para tentar conter as chamas, foram utilizados mais de oito bilhões de litros de água salgada, que posteriormente retornou ao mar e causou a morte de sete toneladas de peixes, por conta da diminuição da taxa de oxigênio na água.

No ano seguinte, mais precisamente em janeiro de 2016, um vazamento de gás na área da Localfrio, no Terminal 1 do porto, que fica no Distrito de Vicente de Carvalho, em Guarujá, liberou uma nuvem tóxica que atingiu várias cidades do entorno, causando apreensão na população, problemas respiratórias e irritação nos olhos em centenas de pessoas, que procuraram atendimento médico em hospitais da região.

ALTA QUANTIDADE DE FERTILIZANTES EM SANTOS LIGA ALERTA APÓS EXPLOSÕES NO LÍBANO

O nitrato de amônio, substância que possivelmente causou uma explosão na região portuária em Beirute, capital do Líbano, também está presente em grandes quantidades em armazéns no Porto de Santos, o maior da América Latina. A substância é um dos principais fertilizantes utilizados na agricultura. Somente em 2019, o cais santista recebeu 5,5 milhões de toneladas de fertilizantes.

RISCOS SOBRE CONTROLE

O acidente no Líbano voltou acender o alerta quanto a armazenagem, controle e manipulação de substâncias químicas nos portos brasileiros. De acordo com informações apuradas pelo G1 no início de mês de agosto (5), o nitrato de amônio, em pequenas quantidades e bem armazenado, não é perigoso. Mas, quando exposto a altas temperaturas, pode resultar em uma grande explosão como ocorreu no Líbano, causando a morte de mais de 100 pessoas e deixando milhares feridas. Além disso, em Beirute, o nitrato de amônio era guardado em um armazém por seis anos e sem a segurança necessária.

Para o Engenheiro químico e de segurança Osmar Domingos Piasentin, a relação da sociedade com as condições de risco não é próxima, pois os planos de gerenciamento de risco são inerentes a cada empresa, e ficam restritas a quem tem o domínio de tomar as ações. “Infelizmente, ele não é muito divulgado (Plano de Gestão de riscos) , o que seria mais adequado”. “Seria importante fazer uma divulgação maior, para que a população pudesse ter mais consciência das condições de onde habita e trabalha, envolvendo todo um sistema de prevenção, para melhorar o controle das condições de risco” afirmou.

Para Piasentini, as empresas envolvidas com a produção, movimentação e estocagem de produtos perigosos são bastante conscientes dos riscos e fazem o máximo para implantar todos os sistemas de controle, e por isso, o nível de segurança é muito bom. “Não é possível ser zero, pois não há como eliminar o risco, e sim controla-lo, como também, mitigar os danos possíveis de acontecer” afirmou.

“Como é que a informação chega nos atores envolvidos? Se a informação não chega, ocorrem casos como o de Brumadinho. Nós temos um bom nível de gerenciamento de risco, mas ele ainda não é o ideal”.

Antônio Lawand

O advogado e professor Antônio Lawand, que também já foi oficial do exército, usou as três fases de avaliação de risco para ratificar a visão de Piasentini sobre o nível de segurança regional. Segundo Lawand, o nível normativo, (legislação que ampara os órgãos de controle) é tão bom ou melhor que de países desenvolvidos. “Em matéria de segurança nós temos uma legislação muito boa, ao ponto de chegarmos as minúcias dos padrões, procedimentos e metodologias”. Afirmou. Lauwand afirmou que em países como Canadá, EUA e Dinamarca, nos quais teve a oportunidade de conhecer, essa prática (detalhamento da norma) não é muito comum. “Em matéria legislativa, normativa/técnica, nós não devemos nada a ninguém” afirmou.

Lawand afirmou ainda que o segundo nível (implementação) ainda consegue ser satisfatório na medida que as empresas costumam avaliar o custo x risco de violar a norma. Mas que é no terceiro nível (integração e qualificação dos atores envolvidos) que estamos mais vulneráveis. “Nós temos desde agencias certificadoras até o cidadão comum, e neste aspecto, o crucial é informação”. Como é que a informação chega nos atores envolvidos? Se a informação não chega, ocorrem casos como o de Brumadinho. Nós temos um bom nível de gerenciamento de risco, mas ele ainda não é o ideal” afirmou

“A transparência no Brasil é muito mais passiva, pois o cidadão tem que ter força de vontade para buscar essa informação. Talvez seja essa a questão que falta para que a população comum. A criação de instrumentos para uma maior governança entre os órgãos governamentais e a sociedade civil

Maria Cristina Gontijo

TRANSPARENCIA

Em Santos, as empresas VLI e Termag são duas que movimentam fertilizantes. Esses locais, além de nitrato de amônio, podem conter outros tipos de substâncias químicas que, combinadas, correm o risco de gerar acidentes. Somente entre 2003 e 2020, foram registrados pelo menos 11 acidentes envolvendo produtos químicos na Baixada Santista. Um deles ocorreu também com nitrato de amônio, em 2017, em Cubatão, gerando uma enorme nuvem de fumaça colorida.

Responsável por 137 mortes e mais de 5 mil feridos, a explosão de Beirute levou lideranças e autoridades locais a retomar a discussão sobre as medidas de segurança adotadas na região, considerando que a substância já provocou tragédias na França (2001 e 1947), na China (1998) e nos EUA (1947).

Para a advogada e professora universitária Maria Cristina Gontijo, a transparência em si existe, a questão são os mecanismos de como chegar a essa transparência. Gontijo argumentou que a transparência técnica de informações desse nível exige um conhecimentos que permitam acessá-la. “A transparência no Brasil é muito mais passiva, pois o cidadão tem que ter força de vontade para buscar essa informação. Os meios para se chegar a essa transparência depende muito do conhecimento técnico e dessa organização”. “Talvez seja essa a questão que falta para que a população comum. A criação de instrumentos para uma maior governança entre os órgãos governamentais e a sociedade civil “argumentou.

FUTURO – SINERGIA ENTRE CLUBES, GOVERNO E EMPRESAS

Foi um consenso entre os convidados de que é necessário melhor os instrumentos de educação e articulação com a sociedade civil de forma a fortalecer os mecanismos de controle de risco e mitigação de danos.

            A participação das diversas organizações sociais na elaboração dos mapas de risco e recursos de enfrentamento também foi um consenso entre os participantes, que apostam na educação precoce nas escolas e outros programas apoiados por governo e empresas.

Assista ao programa completo

live Protagonismo Regional em Debate, promovido e organizado pelo Movimento Protagonismo Cidadão é transmitido pelo Youtube, Facebook e Instagram todas as segundas feiras, a partir das 19h30h.

SOBRE OS CONVIDADOS

OSMAR DOMINGOS PIASENTIN

Engenheiro Químico com especialização em Petroquímica e Fertilizantes. Pós-Graduado em Engenharia de Segurança Trabalhou por 23 anos na Ultrafertil e Fosfert, e por 9 anos na Bureau Veritas como Auditor Ambiental.

MARIA CRISTINA GONTIJO– Advogada. Auditora Ambiental de Portos. Mestre em Direito Ambiental pela Universidade Católica de Santos. Professora da Universidade Santa Cecília (UNISANTA), do CENEP – Centro de Excelência Portuária de Santos,– UNISANTA/. Autora de artigos e capítulos de livros nas áreas do Direito Ambiental, Marítimo e Portuário.

ANTONIO ELIAN LAWAND JR. – Doutorando, Mestre e Bacharel em Direito pela U. Católica de Santos. Pós-graduado pela U. de Tampere (Finlândia). Professor universitário e advogado no E. São Paulo.

Apresentação – SÉRGIO FRANÇA COELHO