25 de outubro de 2021
Colaboração de Maria Cristina Gontijo
Equidade de gênero nas relações laborais é uma temática discutida desde a revolução industrial e a entrada das mulheres como força de trabalho nas primeiras fábricas e minas de carvão. Séculos após a 1ª. Revolução Industrial, depois das primeiras greves e até mortes de trabalhadoras, as mulheres continuam a lutar por salários melhores e reconhecimento no mercado de trabalho. A navegação passou por três fases: o das embarcações a vela e a remo, o das embarcações a vapor e o das embarcações a propulsão nuclear. Nos dois primeiros períodos, é raro ouvir falar de mulheres na indústria portuária e da navegação.
Além de questões culturais que afastaram as mulheres por anos da navegação (superstições como: mulher a bordo de um navio dá azar), a principal seria justamente a força física para amarrar e puxar cordas, remar e fazer serviços pesados. Já no porto, quem não lembra da famosa foto dos estivadores santistas com grande quantidade de sacas de café nas costas? A afirmação era: Que mulher seria capaz de carregar tantas sacas nas costas? Mulheres engravidam, não serviriam para trabalhar em locais insalubres e instáveis.
REVOLUÇÕES INDUSTRIAIS E DE COSTUMES – A situação começa a mudar a partir da descoberta da propulsão nuclear, do petróleo e do contêiner. Um crescimento acelerado da indústria da navegação, com novas tecnologias sendo aplicadas ao setor, a vinda dos primeiros guindastes e outros instrumentos como os portêineres, que no início sofreram protestos por parte dos trabalhadores portuários, começaram a abrir possibilidades à participação feminina na indústria da navegação e nos portos como um todo.
As novas tecnologias, sendo utilizadas da forma adequada e com a devida capacitação, tornaram possível que as mulheres passassem a ter mais oportunidades em um setor predominantemente masculino. Fica claro que a mecanização e a automação não as colocaram tão somente como trabalhadoras da linha de frente, mas fizeram também com que passassem a ocupar cargos nas áreas de TI, na área de administração, contabilidade e logística, como corpo jurídico de empresas e terminais, e cargos de alta direção nas empresas privadas ou nas agências reguladoras estatais, todos antes dominados unicamente por homens.
PROPORÇÕES E DISCREPANCIAS – Mesmo assim, diferente de outros setores em que as mulheres conquistaram espaço considerável, na indústria da navegação e na atividade portuária a discrepância ainda assusta a nível mundial. Dados da Organização Marítima Internacional, mostram que da força de trabalho marítima e portuária, somente 2% é composta pelo gênero feminino no continente europeu (IMO, 2019). A própria Organização, ligada a ONU, possui diversos programas que visam incentivar a equidade de gênero na indústria marítima.
Já no Brasil, dados das EFOMM – Escolas de Formação de Oficias da Marinha Mercante, mostram que entre 2001 a 2016 a mulheres representaram um total de 538 oficiais de náutica e 227 oficiais de máquina, ou seja, 28,8% em relação aos homens formados. Isso não quer dizer que todas estão empregadas no setor. Lembrando que não fazem nem 41 anos que a Marinha de Guerra do Brasil foi a primeira força armada a permitir mulheres em seus quadros.
Ainda no Brasil, na indústria offshore (plataformas de petróleo), as mulheres já se fazem mais presentes nas plataformas de petróleo. No porto, temos mulheres participando das operações, como por exemplo, as amarradoras e operadoras de guindastes.
INICIATIVAS E FUTURO – Isso é o bastante? Definitivamente não. Há muito ainda a ser feito. O certo (ou deveria ser) é que as tecnologias devem ser objeto de estudo e inserção, e jamais de segregação. Por isso, enquanto alguns enxergam tão somente o lado ruim da mecanização e da automação, foram tais tecnologias, assim como gestores e gestoras conscientes, que possibilitaram com que as mulheres ganhassem espaço em locais até então impensáveis. Tais conquistas não são por pena, mas por mérito e competência de cada mulher que ali chegou.
Afinal, existindo programas de incentivo e educação direcionada, as mulheres poderão optar em estar ou não estar em determinados postos de trabalho, assim como os homens.
E quanto aos jovens? Como atender o desafio de inseri-los neste mercado em constantes mudanças tecnológicas em seus processos? As lógicas são bastante parecidas e passam pelas mesmas questões culturais apontadas aqui? A tecnologia pode auxiliar nesta democratização do acesso ao mercado sem comprometer sua eficiência?
Definitivamente não estamos mais na era de empilhar sacos nas costas, mas isso não quer dizer que os trabalhadores e trabalhadoras marítimos e portuários não devam receber a valorização devida e não tenham de passar por novos processos de aprendizado. E isso só poderá ser feito com uma mudança de cultura de todos os envolvidos no complexo sistema portuário.
Diante de tal cenário, o que está sendo feito pelos setores publico e privado? O preconceito seria o fator predominante o a equação de elementos é mais ampla? Quais as vantagens de investir e tecnologia e qualificação de forma a incentivar a presença de mulheres na indústria portuária?
Para refletir sobre esse tema, o painel PORTO CIDADE INDUSTRIA, promoveu no programa de 25 de outubro de 2021, o debate: OPORTUNIDADES – Desafios das mulheres e dos jovens no mercado de trabalho portuário e industrial.
Que teve como convidados:
Janaina Lima – Vereadora de São Paulo
João Vilela – Empresário do comércio
Maria Cristina Gontijo – Advogada e Coordenadora do CENEP